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sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

Max e Mathilde Maier foram salvos em Rolândia

Refugiados do nazismo: dos cafezais de Rolândia à histórica Casa Edith


Conhecer as histórias de Max, Mathilde  faz perceber como a história do mundo e a de nossas cidades se entrelaça.


Max e Mathilde Maier. Foto: Arquivo pessoal

O genocídio de judeus, ciganos Roma e Sinti, população negra, homossexuais, pessoas com deficiências, opositores políticos e outras populações perseguidas pelos nazistas foi um marco na autoimagem que a humanidade, ou ao menos parte dela, cultiva. 

Tratam-se de acontecimentos ocorridos no continente europeu nos anos 1930 e 1940, ou seja, entre 75 e 90 anos atrás. É legítimo, portanto, se perguntar: o que esse passado tem a ver com nossa realidade temporal e geograficamente tão afastada?

A memória do Holocausto provocou reflexões sobre temas como genocídios, racismo, desigualdade, progresso e formas de governo. Ela também criou paradigmas e deixou legados éticos para as próximas gerações. 
Nesse sentido, colaboradores do Museu do Holocausto de Curitiba têm, nessa coluna, utilizado o evento histórico do Holocausto como ponto de partida para discutir diversos temas contemporâneos, dentre eles o ressentimento na política, os genocídios sofridos por negros e indígenas no Brasil ou a relação não-direta entre conhecimento e emancipação.
Dessa vez, o que pretendemos apontar, no entanto, é como essas relações entre o distante e o próximo podem, muitas vezes, ser também bastante diretas. Tal como fazemos nas visitas mediadas na exposição permanente do Museu, comecemos contando algumas histórias individuais.

Max e Mathilde Maier

Max e Mathilde eram um casal de judeus alemães de Frankfurt. Tal como a maioria dos judeus da Alemanha do primeiro terço do século XX, viviam bastante integrados na sociedade alemã. Ambos provinham de meios intelectualizados e se conheceram em um círculo filosófico que discutia a obra de Platão. Max havia combatido pelo exército alemão na Primeira Guerra Mundial e, no período entreguerras, construiu uma bem sucedida carreira como advogado.

Nos primeiros anos de regime nazista, os Maier ajudaram vários judeus a deixar a Alemanha rumo à América. Ao mesmo tempo, também faziam arranjos para a própria fuga caso se demonstrasse necessária. Foi assim que descobriram a possibilidade de vir para o Brasil.

Uma das formas de facilitar o visto era comprar um lote agrícola. No entanto, o governo alemão limitava a quantidade de dinheiro que podia ser enviada para fora do país. Diante disso, surgiu uma oportunidade para alguns judeus e opositores políticos do nazismo. 
Uma companhia britânica havia comprado terras no Norte do Paraná e as loteado para produção de café e propôs uma triangulação, por meio do qual os refugiados compravam ferro para a construção de uma ferrovia no Sul do Brasil por essa companhia em troca de uma espécie de “vale-terras”. 
As propriedades eram a então Gleba Roland, hoje município de Rolândia. Cerca de 400 famílias alemãs lá se estabeleceram, das quais aproximadamente 80 compostas por judeus ou classificados pelas leis nazistas como “racialmente judeus”.

Em 1938, pouco após o pogrom conhecido como “Noite dos Cristais”, Max e Mathilde chegaram ao Brasil. Em Rolândia, os Maier se dedicaram à principal atividade econômica da região à época: o café. Passaram o resto de suas vidas em Rolândia – Max faleceu em 1976 e Mathilde em 1997, com mais de 100 anos de idade. Assim, a trajetória de um casal de judeus alemães altamente urbanizado, refugiados do nazismo, acaba se inserindo na história da economia cafeeira do Norte do Paraná.