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quarta-feira, 2 de maio de 2018

STF caminha para restringir foro de parlamentares, mas posição abre brecha para "chicanas" processuais

Redação Reuters


Por Ricardo Brito


BRASÍLIA (Reuters) - A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou a favor de se restringir o alcance do foro privilegiado aos deputados federais e senadores para crimes cometidos no exercício do mandato e apenas em relação a fatos diretamente vinculados ao trabalho do parlamentar.


Essa posição abre brecha para chicanas processuais que podem gerar o efeito contrário ao pretendido, de garantir rapidez e efetividade na apreciação dos casos, na opinião da corrente minoritária da corte e de advogados criminalistas ouvidos pela Reuters.


Ainda não é possível mensurar com precisão o efeito da mudança nos casos de deputados e senadores investigados na operação Lava Jato. De maneira geral, segundo criminalistas, casos que envolveram suposto recebimento de propina antes de o parlamentar assumir o mandato deixaria o STF, mas é preciso avaliar as circunstâncias.


Atualmente os 513 deputados e 81 senadores gozam da prerrogativa de responderem por quaisquer infrações penais perante o Supremo, mesmo aquelas cometidas antes do mandato.


Após dois adiamentos por pedido de vista, o julgamento da restrição do foro —que começou há quase um ano— conta com 10 votos a favor de limitar o foro dos parlamentares, mas com duas correntes de alcance distintas. O julgamento será retomado na quinta-feira com o último voto, o do ministro Gilmar Mendes.


Até o momento, sete ministros concordam com a posição de que o STF julgue apenas processos sobre crimes comuns cometidos por deputados e senadores no exercício do mandato e por fatos relacionados à função que desempenham, na linha do voto do relator da ação, Luís Roberto Barroso. Os demais casos seriam apreciados pela primeira instância da Justiça.


Outros três votos são favoráveis a uma interpretação ainda mais restrita, a de que, independentemente dos casos, os parlamentares terão direito a foro no Supremo a partir da diplomação. Esse é o entendimento do voto do ministro Alexandre de Moraes, que foi acompanhado nesta quarta-feira pelos ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski.


Apesar de já haver maioria formada, nada impede que os ministros que já votaram alterem seu posicionamento ou até mesmo peçam um esclarecimento mais preciso sobre o alcance da decisão até a proclamação do resultado.


Na sessão desta quarta, o ministro Luiz Fux, que votou com Barroso chegou a comentar que é importante definir melhor o alcance da medida. O próprio Barroso deu a entender que vai se pronunciar sobre o limite da restrição do foro.
BAGUNÇA


Responsável pelo voto vista desta quarta, Dias Toffoli destacou que a Constituição Federal não faz distinção entre a concessão de foro privilegiado para os tipos de crimes cometidos por parlamentares após a diplomação, se eles têm relação direta ou não com o mandato. Para ele, qualquer interpretação diferente a essa é “reescrever” a Constituição.



“Neste ponto, permito-me externar, perante meus pares, minha preocupação com a eventual porosidade, em razão da maior margem de apreciação que venha a decorrer da subjetividade do intérprete, do critério de determinação da competência ex ratione muneris (em razão da função) do Supremo Tribunal Federal”, disse Toffoli, para quem a linha do voto prevalecente vai exigir que a corte “continue a se pronunciar, caso a caso, se o crime tem ou não relação com o mandato”.


Lewandowski, que votou em seguida, foi na mesma linha. “Entendo que, se adotarmos essa saída definida pelo ministro Alexandre de Moraes, estaremos consertando o cerne da garantia de uma atuação independente dos parlamentares”, disse. “Esta solução protege o parlamentar de uma ação temerária que possa tisnar o exercício do mandato”, completou.


Embora não tenha votado, Gilmar Mendes criticou duramente a posição defendida por Barroso e seguida pela maioria até o momento. Para ele, a posição a ser adotada “vai dar muito errado”. Ele disse que não há indicações de que essa posição vai garantir maior eficácia para a apreciação de casos envolvendo parlamentares.


“É cruel enganar o povo, não estamos fazendo para o sistema evoluir e estamos fazendo uma grande bagunça”, disse. “Aqui não é um jogo de esperteza, é de sinceridade na interpretação da Constituição”, reforçou.


Antes da sessão de julgamento desta quarta, em entrevista, e também durante o julgamento, Alexandre de Moraes disse que a posição majoritária vai suscitar vários outros questionamentos sobre competência do Supremo.


“Essa primeira questão de ordem (de Barroso) que vai suscitar várias questões de ordem. Vai desmembrar tudo? Como fica a investigação? Alguém que era deputado estadual quando praticou o crime, um crime relacionado às funções de deputado estadual, e agora é deputado federal, ele praticou antes, então aqui no Supremo não vai ficar, ele volta pro Tribunal de Justiça ou pra primeira instância?”, provocou ele a jornalistas, ao destacar que isso será decidido caso a caso.
SURPRESA


O receio dos críticos é que haja uma discussão interminável sobre se determinado caso ficaria com o Supremo ou com a primeira instância, levando a vários recursos processuais e impedindo a apreciação do mérito dos processos.


O criminalista Alberto Toron, que representa o senador Aécio Neves (PSDB-MG), réu no STF, afirmou que, apesar de considerar “louvável” o esforço de Barroso em restringir o foro, a posição dele abre brecha para “interpretações díspares”.


“Longe de solucionar a controvérsia vai criar novas e com risco de se preterir ao acusado um direito a um juiz natural”, criticou. Ele disse que “já passou da hora” de o Congresso discutir para valer a questão do alcance ou fim do foro, embora reconheça ser difícil isso ocorrer em 2018, ano eleitoral.



Para o criminalista Bruno Spiñeira Lemos, que defende o empresário Lucio Funaro, que fez delação na Lava Jato, no intuito de dar uma satisfação à sociedade, a decisão da corte poderá ter o “efeito reverso”.


“Óbvio que isso é possível. O Supremo está nos brindando com decisões surpreendentes”, disse. “Há muito espaço para subjetivismos”, completou.

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