TEXTO E .foto de Alberto D'angele
VITÓRIA DA ISABELLY, AGORA NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA - Depois do juiz de Rolândia, agora é o Des. Guido Dobelli do Tribunal de Justiça do Paraná que negou pedido do Governo do Estado: ele manteve a determinação para que a energia elétrica dos aparelhos de saúde da Isabelly seja custeada pelo Poder Público. Na fundamentada decisão abaixo, ele deixa claro que o direito à saúde da Isabelly é maior do que qualquer justificativa orçamentária ou legalista.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a decisão interlocutória de fls. 27/32-TJ, proferida nos autos nº 0007522-79.2015.8.16.0148 de Ação de Obrigação de Fazer ajuizada por ISABELLY VITÓRIA PARDIM DE DEUS MELLO (representada por seu genitor WAGNER ROBERTO MELLO) em face do ESTADO DO PARANÁ e da COPEL DISTRIBUIÇÃO S.A., mediante a qual o MM.
Juiz concedeu a antecipação dos efeitos da tutela formulada na inicial para os fins de determinar:
(1) "que o ESTADO DO PARANÁ custeie os valores referentes ao consumo de energia elétrica utilizados pelos aparelhos médicos essenciais ao tratamento da requerente ISABELLY VITORIA PARDIM DE DEUS MELLO, no prazo de 48 (quarenta) [sic] horas, a contar da intimação da presente decisão, sob pena de aplicação de multa diária no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por dia de descumprimento. Consigno, o custeio deverá iniciar a partir da distribuição do presente feito.";
(ii) "que a segunda requerida (COPEL DISTRIBUIÇÃO S/A) instale, no prazo de 05 (cinco) dias úteis a contar a partir da intimação da presente decisão, medidor que individualize o consumo elétrico dos aparelhos e lâmpadas do quarto em que permanece a Autora em recuperação, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)."
Em suas razões de insurgência, o ESTADO DO PARANÁ defende o cabimento do agravo na modalidade instrumental e, no mérito, sustenta, em síntese, que não estão presentes os requisitos para a antecipação de tutela deferida pelo
2- Juízo de origem. Afirma que, havendo concessão para a prestação do serviço público, não cabe ao ente público resolver qualquer questão relacionada à medição do consumo de energia e muito menos no tocante aos custos/tarifa pelo uso, vez que não há determinação legal para que o poder público preste o serviço gratuitamente.
Destaca que o art. 2º, § 1º, da Lei 12.212/2010, que trata da Tarifa Social da Energia Elétrica, é expresso ao prever a referida tarifa social para o caso de residência que tenha entre os familiares membro portador de doença ou patologia, cujo tratamento ou procedimento médico requeira o uso continuado de aparelhos, equipamentos e instrumentos, que, para seu funcionamento, demandem consumo de energia elétrica.
Pontua que a autora não comprovou a negativa da COPEL no tocante ao pedido de isenção da tarifa de energia elétrica em razão do tratamento de saúde, e que a ordem concedida anteriormente para que a Copel se abstenha de cortar o fornecimento de energia elétrica na residência da autora, por si só, afasta o alegado perigo de dano irreparável ou de difícil reparação.
Argumenta que a tutela antecipada concedida ofende diretamente o princípio constitucional da igualdade, pois outros cidadãos na mesma condição que a autora recebem, por certo, apenas a isenção ou desconto previsto na legislação acima citada, ao passo que a autora vai ser beneficiada em desacordo com a lei e em evidente afronta ao princípio da isonomia.
Diz que a medida é irreversível, pois esgota o objeto da ação e porque a paciente não terá condições de ressarcir os cofres públicos.
Por fim, aduz que a multa diária deve ser excluída ou, ao menos, reduzida, por ter sido fixada em valor excessivo e incongruente com a obrigação principal, evitando-se o enriquecimento ilícito da autora.
3- Requer a suspensão da ordem de custeio das contas de luz da autora; o provimento liminar do agravo ou o provimento final para revogar a tutela antecipada e afastar qualquer condenação/obrigação de fazer ao Estado do Paraná, bem como para afastar a multa diária ou reduzir o seu valor.
II. Em análise preliminar e sem prejuízo de posterior reexame, os requisitos de admissibilidade se mostram presentes, razão pela qual recebo o recurso para regular processamento.
O art. 527 c/c art. 558 do CPC possibilitam ao relator a atribuição de efeito suspensivo ao recurso ou a antecipação dos efeitos da tutela recursal, nos casos em que vislumbrar o risco de lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação.
Neste exame preliminar dos autos, baseado em juízo de cognição sumária, não vislumbro a existência de plausibilidade suficiente nas razões de insurgência para se antecipar ao mérito recursal e sobrestar os efeitos da medida liminar combatida.
Isso porque a imposição ao agravante da obrigação de custear a energia elétrica consumida pelos aparelhos médicos, os quais asseguram a manutenção da vida da menor, consubstancia mero desdobramento da tutela jurisdicional anteriormente concedida por meio das sucessivas ordens judiciais que visaram garantir o integral atendimento à saúde e à vida da postulante, ainda dentro do espírito do art. 196 da Constituição Federal.
A singularidade do caso permite visualizar que, dentro da obrigação do ente público de fornecer o pleno tratamento de saúde do qual a paciente necessita, encontra-se alocado - como corolário lógico - o dever de suportar também o ônus financeiro para o regular funcionamento dos equipamentos médicos.
4- Com efeito, a Lei 12.212/2010, invocada pelo agravante, parece não dar conta de solucionar o problema, vez que o art. 1º, inciso IV, prevê que "para a parcela do consumo superior a 220 (duzentos e vinte) kWh/mês, não haverá desconto", ao passo que o consumo mensal na residência da paciente tem ultrapassado o montante de 800 KWh (fl. 100-TJ), indicando que a aplicação, mesmo que cumulativa, dos descontos gradativos previstos no referido diploma legal, não tem se mostrado suficiente para livrar os genitores dos altos encargos inerentes ao consumo elétrico.
Tampouco a Portaria Interministerial nº 630/2011 oferece panorama mais alentador, já que apenas se refere ao benefício da Tarifa Social de Energia Elétrica, o que, como visto, não demonstra aptidão para solucionar o conflito ora delineado.
Além disso, não se justifica a preocupação do agravante de que deverá arcar com "o pagamento de valores sequer identificados de pronto, o que faz concluir que referidos valores podem se tornar impagáveis, na hipótese de serem instalados ainda mais aparelhos para o tratamento da autora" (fl. 11-TJ).
Ora, a segunda medida impositiva constante da decisão liminar - desta feita dirigida à COPEL DISTRIBUIÇÃO S.A. -, ao determinar a instalação de medidor individual de consumo, cuidou exatamente de assegurar que a obrigação de custeio imposta ao agravante fique delimitada aos gastos de energia elétrica estritamente decorrentes do tratamento médico da menor.
Assim, na eventual hipótese de ser concedida isenção tarifária para o consumo associado ao tratamento médico da paciente, a benesse se restringirá ao quantum necessário e justo, sem malferir o princípio da isonomia e evitando uma maior transferência de ônus aos demais consumidores de energia elétrica do Estado do Paraná.
5 - Ademais, é válido considerar que, caso a paciente permanecesse hospitalizada, com atendimento pelo Sistema Único de Saúde, o custo do tratamento (incluindo o gasto com eletricidade) também haveria de ser suportado pelos cofres públicos.
No tocante à aventada irreversibilidade da medida, cumpre estar atento ao fato de que o risco de dano é infinitamente maior à paciente, cuja vida depende do funcionamento daqueles aparelhos.
Nessa toada, considerando a relevância do bem jurídico que, em última análise, pretende-se tutelar (a vida da menor), não vislumbro traços de desproporcionalidade na multa diária fixada.
Ante o exposto, indefiro o efeito suspensivo postulado.
III. À Seção da Câmara para que, via sistema Mensageiro, comunique o MM. Juiz a quo sobre os termos do presente despacho, requisitando que, no prazo de (10) dias, preste as informações que julgar convenientes, inclusive quanto ao cumprimento do disposto no art. 526 do Código de Processo Civil.
IV. Intime-se a parte agravada, para que, querendo, no prazo legal, apresente resposta.
V. Após, abra-se vista à d. Procuradoria-Geral de Justiça.
Para a celeridade no cumprimento dos atos, autorizo o (a) Chefe de Seção da 4ª Câmara Cível a subscrever os expedientes necessários.
Curitiba, 24 de agosto de 2015.
Des. GUIDO DÖBELI Relator