O Norte do Paraná é uma das regiões do País que, mesmo distante do litoral e das capitais, mesmo tendo uma história muito recente, as suas memórias e os seus patrimônios marcam profundamente as suas identidades cotidianas. As universidades oferecem cursos de pós-graduação na área patrimonial, que a cada ano recebem um número maior de interessados nas questões que envolvem as histórias locais, sem o viés clientelista do pioneirismo, reconhecendo que todos os cidadãos colaboram para a construção deste espaço, uma vez que simultaneamente marcam e são marcados por ele.
No entanto, via de regra, o poder público tem se omitido nessa questão, ameaçando a integridade dos bens edificados reconhecidos como históricos. O caso mais flagrante e visível desta omissão foi o do Hotel Rolândia. Construído em 1932, ele era um marco, não apenas para aquela localidade, mas para todo o Norte do Paraná e para a história da imigração no Brasil. Diferentes gestões ignoraram sua importância, mantendo-o nas mãos privadas mesmo quando já não tinha condições técnicas de funcionar como um hotel. E nada de virar museu, memorial do imigrante ou um espaço cultural. Os ex-proprietários colocaram o edifício à venda, e nem assim a municipalidade de Rolândia se interessou em proteger e salvar o hotel. Ao que se sabe, nenhuma proposta de compra foi feita pela prefeitura, sequer uma assessoria foi formada para debater a questão e propor as soluções, como um processo de desapropriação, por exemplo.
Depois de alguma grita da população e da imprensa, a Prefeitura de Rolândia teve a mais infeliz das ideias: desmontar o hotel na pretensão de manter ao menos sua fachada. Sem técnica e sem método, o prédio não foi desmontado, foi demolido e seus restos amontoados de qualquer maneira em um galpão sem proteção contra a insolação, umidade e furtos. Resultado: é pouco provável que possamos ver novamente a fachada do Hotel Rolândia, e a vocação turística da região fica ameaçada, uma vez que por falta de uma política patrimonial consistente, simulacros são construídos, na tentativa de tornar uma cidade multiétnica como Rolândia, em uma cidade alemã. O pode público optou por inventar tradições ao invés de proteger eficazmente as edificações que fizeram e fazem a sua história.
Outros lugares de memória em Rolândia estão ameaçados, são descaracterizados ou destruídos sem que a população e as instituições interessadas na defesa desse patrimônio tenham tempo de se mobilizar. Isso é agravado quando se observa que a maior parte desses bens está em mãos privadas, que não têm nenhuma preocupação na sua preservação, e o poder público, que poderia ser um órgão fiscalizador e orientador da manutenção das características históricas, se omite. O conjunto da fazenda Gilgala já foi destruído, a Fazenda Janeta tem sido reformada, retocada, mudada sem nenhum acompanhamento técnico necessário e o conjunto da Igreja do São Rafael, se não for feito nada, brevemente nada dirá às gerações futuras.
Os erros que envolvem a destruição do Hotel Rolândia servem de alerta. É fundamental que as novas gestões dos municípios do Norte do Paraná estabeleçam políticas públicas de conservação e preservação dos bens edificados de cunho histórico, pois como nos alerta um belo samba, pensar o futuro implica em não esquecer o passado.
MARCO ANTONIO NEVES SOARES
é professor do departamento de
História e coordenador do Centro
de Documentação e Pesquisa Histórica