SENTENÇA
A coligação “PELO BEM DE ROLÂNDIA” e EURIDES MOURA, ajuizaram a presente AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL em face de JOÃO ERNESTO JOHNNY LEHMANN (JONI) e JOSÉ DANILSON ALVES DE OLIVEIRA, imputando-lhes a prática de abuso de poder político e econômico, tendo em vista a prática das condutas vedadas no art. 73, inciso II e VI, letra “b”, da Lei 9.504/97, porque, utilizando-se de serviços custeados pelo Município de Rolândia, fizeram inserir no holerite referente a competência de setembro/2012 mensagem de cunho político-eleitoreira do seguinte teor:
“Rolândia vive um excelente momento e isso não pode parar! Além de UTI, asfalto e casas após 14 anos, os rolandenses serão beneficiados com uma nova Escola Estadual (San Fernando), um novo Posto de Saúde (Parigot), Unidade da Mulher e da Infância (Nobre) e 3 novos Conjuntos Residenciais.”
Aduzem que a conduta é manifestamente ilegal e teve evidente cunho eleitoral porque os holerites, normalmente distribuídos nos dias 7 e 8 de cada mês, no caso foram entregues aos funcionários nos dias 3 e 4 de outubro/2012, ou seja, poucos dias antes da eleição que se realizou no dia 07/outubro/2012, provocando desequilíbrio no pleito.
Finalizam pedindo oportunidade de produzir provas e que ao final seja a pressente AIJE julgada procedente, aplicando-se aos investigados a multa pertinente, a cassação do registro de candidatura ou dos diplomas, e declarada a inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes, na forma do que estabelece o art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90.
A inicial veio instruída com os documentos de fls. 21-26.
Pessoalmente noticiados, os representados, tempestivamente, apresentaram defesa – fls. 34-57 –, acompanhada dos documentos de fls. 59 a 135, alegando, em preliminar, a ilegitimidade ativa da coligação requerente, considerando que já se encontra encerrado o período eleitoral, motivo pelo qual extinguiu-se a personalidade jurídica porque as coligações funcionam como “partidos temporários”; Ilegitimidade passiva ad causam de José Danilson porque é vereador e atua na Câmara e não tem nenhuma participação com confecção e distribuição dos holerites, que são emitidos pela Prefeitura Municipal. No mérito, sustentam que jamais praticaram qualquer ato ilícito eleitoral, abuso do poder político ou econômico. Acrescentam que não autorizaram em momento algum a prática de ato que pudesse macular o processo eleitoral. Esclarecem que os holerites são distribuídos logo após o depósito bancário da remuneração dos servidores sem nenhuma participação dos investigados. Ao contrário do afirmado na inicial, não foram “milhares” de servidores que receberam os holerites, considerando que a Prefeitura Municipal registra um quadro de 1.595 funcionários e, tão logo foi observada a inserção de uma frase de conteúdo vedado, os holerites foram recolhidos, chegando ao conhecimento somente de reduzido número de servidores; Que foi instaurando procedimento administrativo para apurar a responsabilidade pelo ato e desobediência a Instrução Normativa PGM nº 001/2012 de 28/6/2012 distribuída com a recomendação de que não fossem cometidas condutas vedadas em período eleitoral; Que não houve propaganda eleitoral propriamente dita nem propaganda institucional, mas tão somente mensagem informativa que chegou a reduzido número de servidores municipais, sem nenhuma potencialidade de influir no resultado do pleito, pois a diferença entre o primeiro colocado (o investigado João Ernesto) para o segundo, o autor Eurides Moura, é superior a 7.200 votos. Citam precedentes jurisprudenciais e doutrinários para demonstrar que o fato narrado não caracteriza abuso de poder político ou econômico e, para tornar possível a cassação do registro do candidato, é preciso que fique evidenciada a potencialidade lesiva apta a influir no resultado do pleito. Concluem postulando a produção de provas, apresentando rol de testemunhas, e que ao final seja julgado improcedente o pedido formulado na inicial.
A representante do Ministério Público oficiou nos autos às fls. 139-142, manifestando-se pela rejeição das preliminares arguidas na defesa e pela produção das provas requeridas.
No despacho lançado às fls. 143 este Juízo rejeitou a preliminar que diz respeito a ilegitimidade ativa da coligação e, quando a ilegitimidade passiva de José Danilson, por se tratar de tema que envolve o mérito, ficou para análise na sentença.
Na audiência de instrução (fls. 146-156) foram inquiridas duas testemunhas arroladas pelos autores e sete indicadas pelos investigados, juntando-se aos autos os holerites trazidos em mãos pelas testemunhas Fábio Nogaroto e Margarete Leles Nogaroto, cf. fls. 157-173.
Nos memoriais os autores (às fls. 174-182) sustentam que a prova deixou perfeitamente claro que existiu abuso de poder político e econômico por parte dos investigados ao fazerem propaganda eleitoral direta utilizando-se de recursos públicos municipais, inserindo mensagem no holerite distribuído aos servidores poucos dias antes das eleições. Observa que os holerites contendo propaganda eleitoral foram destinados a aproximadamente 1600 servidores (incluídos os aposentados), tudo custeado pelos cofres públicos. Enfatizam que a prova deixou esclarecido que o investigado João Ernesto tinha pleno conhecimento da prática da conduta vedada que desencadeou grave desequilíbrio no pleito municipal. Pedem a procedência e consequente aplicação das sanções previstas na LC 64/90 (multa, cassação do registro e inelegibilidade por 8 anos).
Os investigados – fls. 201 a 208 - insurgem-se inicialmente com a juntada de documentos por ocasião da audiência de instrução, pedindo que sejam desconsiderados e desentranhados dos autos. No tocante as provas sustentam que ficou demonstrado que jamais praticaram ato ilícito eleitoral; que em nenhum momento autorizaram a prática de conduta vedada; Que os holerites contendo a frase foram recolhidos em sua maciça maioria conforme atestaram as testemunhas e as assinaturas colhidas nas declarações de fls. 88 a 108; Que não ficou demonstrado algum grau de participação dos investigados na inserção da frase tida por ilegal. Que inexistiu abuso de poder político ou econômico. Pugnam pela improcedência.
A representante do Ministério Público – fls.183-200 – opinou pela rejeição das questões preliminares e, no mérito, teceu comentários sobre as provas produzidas na audiência de instrução e conclui entendendo caracterizada a conduta vedada, motivo pelo qual requer a procedência da AIJE com a condenação dos investigados a pena de multa, cassação do registro da candidatura ou da diplomação e declaração de inelegibilidade pelo prazo de oito anos.
É o relatório do essencial. Decido:
A título de esclarecimento anote-se inicialmente que os investigados João Ernesto Johnny Lehmann e José Danilson Alves de Oliveira, exercem atualmente os cargos de prefeito municipal e vereador, respectivamente. Juntos concorreram neste último pleito municipal, sendo João Ernesto reeleito para o cargo de prefeito e José Danilson como seu vice, com 17.995 votos, o que representa 53,56% dos votos válidos.
A iniciativa da presente AIJE coube a coligação “Pelo Bem de Rolândia”, constituída pelos partidos PSDB, PRB, PMN e PSD que apoiou a candidatura de Eurides Moura ao cargo de prefeito, tendo conquistado 10.739 votos, ou seja, 31,96% dos votos válidos
No tocante a preliminar que diz respeito a ilegitimidade ativa da coligação, o tema ficou decidido no despacho lançado às fls. 143, rejeitando a mencionado arguição porque a legitimidade decorre do próprio texto do artigo 22, caput, da Lei Complementar 64/90, ao atribuir iniciativa a qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral para representar à Justiça Eleitoral pedindo a apuração de uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político.
Ainda que se possa dizer que a coligação funciona como autêntico “partido temporário” e se extinguiria com o fim das eleições, não se encerra essa pessoa jurídica formal, de direito privado, formada pela união de vários partidos, enquanto não findar o processo eleitoral. No caso, o processo eleitoral, a despeito das eleições realizadas no dia 7 de outubro, ainda não está concluído, pois falta a conclusão das prestações de contas e diplomação dos eleitos. Logo, a coligação autora ainda subsiste e tem evidente interesse processual, na medida em que lhe é legítimo defender a lisura do pleito do qual participou com seus candidatos.
Relativamente a legitimidade passiva do investigado José Danilson Alves de Oliveira, cumpre dizer que sua presença no polo passivo da presente AIJE é consequência do litisconsórcio necessário que decorre da natureza da relação jurídica estabelecida pela sua condição de candidato a vice-prefeito do primeiro investigado (João Ernesto), exigindo que a decisão da lide seja uniforme para ambos. Portanto, ainda que o investigado José Danilson não tenha exercido nenhuma função ou cargo na prefeitura municipal, inquestionavelmente está umbilicalmente ligado a candidatura ao cargo de prefeito e naturalmente está sujeito às mesmas sanções nos casos em que a conduta vedada também o beneficie, na forma do que estabelece o § 5º do art. 73 da Lei 9.504/97 .
Nestas circunstâncias logo se vê que o investigado José Danilson deve inquestionavelmente permanecer no polo passivo da demanda. Preliminar rejeitada.
Com referência aos documentos, mais precisamente, holerites apresentados em audiência pelas testemunhas Fabio Nogaroto e Margarete Leles Nogaroto – às fls. 157 a 173 – não merece acolhimento o pedido dos investigados no sentido de que sejam desconsiderados e desentranhados dos autos, porque em última análise sequer podem ser considerados “documentos novos”, porque nada mais são do que o sequencial dos comprovantes de pagamento exibidos com a inicial, às fls. 21-26 e foram mencionados nos depoimentos de todas as testemunhas ouvidas, cuidando-se de documentação que complementa aquela que acompanhou a inicial e vem corroborar o que foi relatado pelas testemunhas, quando se referem a inserção de frases nos holerites distribuídos aos funcionários da prefeitura municipal de Rolândia.
No que se refere ao mérito a presente AIJE comporta parcial procedência, considerando que, contrariamente ao que sustenta a defesa dos investigados, indubitavelmente ficou provada a materialidade da prática de conduta vedada no artigo 73, VI, “b”, da Lei 9.504/97, na medida em que está plenamente evidenciado pelos documentos e depoimentos testemunhais que houve publicidade institucional de atos, programas, obras e serviços municipais no mês de setembro/2012, ou seja, dentro do período vedado, que teve início no dia 07/julho/2012.
De acordo com o que ficou esclarecido com os depoimentos das testemunhas, mais precisamente com as declarações de Michele Cristina e Maria Cristina, as frases são inseridas nos holerites desde o ano de 2009, ou seja, não é nenhuma novidade. Porém, inicialmente era frases de motivação dos funcionários, o que depois se transformou em veículo de publicidade institucional, porque, como pode ser conferido pelos holerites exibidos às fls. 157 a 173, a prefeitura municipal passou a veicular publicidade institucional, destacando obras, serviços e programas. A título de exemplo confira-se:
Em janeiro de 2012 (fls. 157):
“Os rolandenses devem comemorar! A obra da Selmi em Rolândia já está 50% pronta e no 2º semestre, já estará funcionando na cidade. É a administração trabalhando pelo desenvolvimento e pela criação de mais empregos.”
Em abril de 2012, às fls. 158:
“Rolândia vive um excelente momento. Além de ser destaque como o município que mais criou novas empresas no Paraná, a cidade tem gerado milhares de empregos e atraído novas empresas. É assim que Rolândia cresce e Você cresce junto!”
E junho de 2012, às fls. 159:
“Agora Rolândia conta com o serviço de Ouvidoria Gratuita da Saúde pelo telefone 0800 400 134. A Prefeitura também criou os Agentes de Acolhimento. São pessoas que recebem os pacientes nos Postos de Saúde e aceleram e organizam o atendimento. É a Prefeitura investindo para que os rolandenses tenham Saúde de qualidade.”
Os mesmos holerites exibidos às fls. 157 a 173 comprovam que no período em que é vedada a publicidade institucional, a veiculação das frases foi interrompida, cf. fls.160, 161, 171 e 172.
Entretanto, nas vésperas das eleições, mais exatamente nos dias 3 e 4 de outubro de 2012, funcionários ativos e aposentados foram surpreendidos com o holerite referente a competência do mês de setembro – cf. documentos de fls. 21 a 26 - contendo a seguinte texto no rodapé:
“Rolândia vive um excelente momento e isso não pode parar! Além de UTI, asfalto e casas após 14 anos, os rolandenses serão beneficiados com uma nova Escola Estadual (San Fernando), um novo Posto de Saúde (Parigot), Unidade da Mulher e da Infância (Nobre) e 3 novos Conjuntos Residenciais.”
Não é necessário maior esforço de raciocínio para concluir que é clara e manifesta a publicidade institucional!
Está provado também que foi cometida dentro do período vedado no art. 73, VI, da Lei 9.504/97, uma vez que foi veiculada nos dias 3 e 4 de outubro, antevéspera das eleições.
A tese da defesa, sustentando que os investigados desconheciam a conduta e que em nenhum momento autorizaram ou permitiram a publicidade, não encontra suporte nas informações reunidas nos autos.
Por primeiro deve ser observado que a veiculação da publicidade institucional vinha sendo praticada há vários anos consecutivos, logo não podendo o senhor prefeito e investigado João Ernesto alegar ignorância.
Por outro lado, conforme deixaram claro as próprias testemunhas arroladas pelos investigados, as frases eram produzidas pelo assessor de imprensa, apontado como Ney Volante, que exercia cargo de confiança e estava lotado no gabinete do senhor prefeito, de maneira que nem a mais ingênua das criaturas poderia acreditar que o “chefe”, no caso o prefeito, não consentia com tal prática, mesmo porque o assessor de imprensa estava encarregado exatamente de fazer a publicidade institucional e evidentemente colhia no próprio gabinete as informações sobre atos, obras e serviços que deveriam ser publicados.
Acrescente-se ainda que o próprio prefeito recebia holerites, como foi atestado pela procuradora jurídica Miryan Siqueira Rosinski Alves (vide cd’r, tempo: 8’18” ) e por Maria Cristina (vide cd’r: tempo a partir de 10’00”) o que permite afirmar que a veiculação de publicidade era plenamente conhecida do senhor prefeito e por ele consentida, sendo completamente irrelevante para o desfecho da presente ação que a iniciativa das frases tenha partido deste ou daquele servidor, porque, de acordo com precedentes do TRE-PR, é totalmente sem importância que haja autorização da veiculação da publicidade institucional para configurar a conduta vedada no art. 73, VI “b” da Lei 9.504/97. Confira-se:
“A conduta vedada pelo artigo 73, VI, “b”, da Lei nº 9.504/97 aperfeiçoa-se com a veiculação da publicidade institucional, não sendo exigível que haja prova de expressa autorização da divulgação no período vedado, sob pena de tornar inócua a restrição imposta na norma atinente à conduta de impacto significativo na campanha eleitoral.” (RECURSO ELEITORAL Nº 304-46.2012.6.16.0059, Rel. Marcos Roberto Araújo dos Santos, 24/setembro/2012).
Consta dos depoimentos das testemunhas, especialmente da procuradora jurídica Miryan e ainda do documento de fls. 124 (ref. Decreto nº 6955/2012 de 16/outubro/2012), que o investigado João Ernesto determinou o recolhimento dos holerites e instaurou procedimento administrativo para apurar a responsabilidade pela inserção da frase de conteúdo vedado no holerite. Todavia, tais iniciativas não isentam os investigados de responsabilidade, considerando que a atitude somente foi tomada depois que grande parte dos holerites já havia sido distribuída, ou seja, o ilícito já estava consumado, sem contar que a tentativa de “apagar” a conduta ilícita somente se desencadeou depois que o fato ganhou repercussão entre os próprios funcionários, conforme se extrai das declarações de Marcia Terezinha Gorla, que entregou alguns holerites a servidores do seu setor, ou depois do ajuizamento da presente AIJE, conforme disse a testemunha Margarete Leles Nogaroto (cd’r tempo: 1’:49” até 2’:40” e 3’:30” até 4’:50”).
De se destacar que não foi tão somente a inserção da frase de conteúdo vedado que causou estranheza aos funcionários, mas acima de tudo o fato da distribuição dos holerites ter acontecido nos dias 3 4 de outubro de 2012, pouco antes das eleições municipais, quando é certo, segundo se confirma pelos diversos depoimentos, que os holerites chegavam às mãos dos servidores, via de regra, por volta dos dias 7 ou 8 (vide p.ex. declaração de Marcia Teresinha Gorla, tempo 12’:16” até 12’:56”) dai se extraindo que a veiculação da publicidade institucional tinha flagrante intuito eleitoreiro.
A instrução normativa de 28 de junho de 2012 (fls. 122) orientando os senhores secretários e outros cargos de chefia da hierarquia municipal para evitar a prática de condutas vedadas, repetindo o que diz o texto da lei 9.504/97, igualmente não isenta os investigados, pois, de acordo com precedentes do próprio TRE, no Recurso Eleitoral nº 304-46.2012.6.16.0059, desta Zona Eleitoral, entre as mesmas partes e exatamente tendo em foco a publicidade institucional em período vedado, assentou que “a determinação, de forma genérica, que fossem adotadas providências para evitar a ocorrência de condutas vedadas aos agentes públicos, não é suficiente para eximir os representados da responsabilidade dessa infração”.
No que diz respeito a potencialidade lesiva ou de influência no pleito, a questão dispensa maiores divagações, porque as condutas tratados no art. 73 da Lei 9.504/97 são objetivas , de maneira que é irrelevante aqui aprofundar-se na discussão sobre este tema, pois, ainda que aparentemente a conduta vedada não seja capaz de por si mesma ter influído a ponto de modificar o resultado do pleito, haja vista a significativa diferença de votos entre os candidatos – superior a 7.200 votos – ao passo que os holerites não atingiram nem sequer a totalidade dos servidores que somam 1.595 (cf. relatório de fls. 64), e seria abusar da inteligência imaginar que todos se deixaram ou deixariam influenciar, ainda assim a infração se materializa, pois a presunção é jure et de jure de que foi afetada a igualdade de oportunidade entre os candidatos.
Finalizando, contrariamente ao que foi sustentado pelos requerentes e pelo Ministério Público, não se observa no caso concreto em análise, que se resume a veiculação de propaganda de obras e serviços, em período vedado, somente no holerite referente ao mês de setembro, a prática de abuso de poder político ou econômico.
Abuso de poder político se verifica quando o detentor do poder vale-se de sua posição para impor sua vontade sobre o eleitor, afetando a igualdade de oportunidades entre os candidatos no processo eleitoral.
O saudoso mestre Hely Lopes Meirelles, ensina que “o uso do poder é prerrogativa da autoridade. Mas o poder há que ser usado normalmente, sem abuso. Usar normalmente do poder é empregá-lo segundo as normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as exigências do interesse público. Abusar do poder é empregá-lo fora da lei, sem utilidade pública. O poder é confiado ao administrador público para ser usado em benefício da coletividade administrada, mas usado nos justos limites que o bem-estar social exigir. A utilização desproporcional do poder, o emprego arbitrário da força, a violência contra o administrado, constituem formas abusivas do uso do poder estatal, não toleradas pelo direito e justificadores dos atos que as encerram. O uso do poder é lícito; o abuso, sempre ilícito. Daí por que todo ato abusivo é nulo, por excesso ou desvio de poder.”
Pois bem, na situação em análise, embora seja certo que os investigados se beneficiaram de alguma forma com a veiculação de publicidade institucional em período vedado, cuja conduta objetivamente se presume que afeta a igualdade de oportunidades entre candidatos e, portanto, conduz a aplicação da sanção de multa (vide nota de rodapé nº 3), no entanto, para a conduta vedada ser alçada ao patamar de “abuso de poder político” é necessário que fique provado que o detentor do poder não só tenha consentido com sua prática, mas ordenado e imposto sua autoridade hierárquica sobre os servidores para influir na liberdade do seu voto. No caso inexiste esta prova e também não há indícios de que algum dos investigados tenha se prevalecido do poder político exercido no município para impor sua vontade sobre eleitores ou servidores. O que houve foi a simples aquiescência com a prática de publicidade institucional em período vedado pela Lei Eleitoral, o que é suficiente apenas para a imposição da sanção pecuniária, não as sanções do artigo 22 das LC 64/90. Para tanto (cassação de registro e inelegibilidade por oito anos) é preciso ter em conta a real potencialidade da conduta ilícita de ter influído no resultado das eleições, impondo-se que seja considerado o número de pessoas atingidas, a publicidade e repercussão do fato no meio social, tamanho do eleitorado, o grau de instrução, a situação financeira, as características da região e da cultura do povo. Na situação ora em análise, conforme já mencionado no corpo desta sentença, a conduta vedada atingiu um reduzido número de pessoas – apenas alguns servidores municipais de um universo de 1.595 – os quais, pelo seu grau de instrução e nível cultural logo verificaram o ato com “estranheza”, vale dizer, não se deixaram influenciar. O fato somente ganhou notoriedade e grande publicidade após as eleições, mais exatamente depois do ajuizamento deste AIJE, o que significa dizer que a conduta ilícita em nenhum momento foi capaz de influir o voto da população em geral.
Quanto ao suposto abuso de poder econômico também não há nenhuma prova.
Abusar do poder econômico significa utilizar-se de recursos financeiros ou de atividade com a finalidade de eliminar ou diminuir as forças do concorrente, no caso os demais candidatos no pleito eleitoral, distribuindo benesses a eleitores com vistas a conquistar o seu voto.
No caso retratado nos autos não se apresenta caracterizada tal situação porque não houve distribuição nem promessa de benesse aos eleitores. Houve sim a inserção de frases nos holerites dos servidores municipais, inicialmente de cunho motivacional e depois publicitário, cuja prática era rotineira e a princípio permitida pelo que consta do no art. 37, § 1º da Constituição Federal (é vedada somente nos três meses que antecedem as eleições, cf. art. 73, VI da Lei 9.504/97). Não consta que a inserção destas frases tenha elevado o custo de impressão dos holerites, causando algum prejuízo aos cofres públicos. A quantidade de holerites impressos não é vultosa. No período vedado no art. 73, VI “b” da Lei 9.504/97, houve apenas uma inserção, relativa a competência do mês de setembro/2012.
Por último, no que concerne a sanção a ser aplicada, é preciso ter em conta o grau de gravidade da conduta ilícita, sua repercussão, sua real potencialidade de influir no pleito, número de pessoas atingidas, circunstâncias em que ocorreu e consequências que dela decorreram, balizando-se o julgador pelos princípios da proporcionalidade e razoabilidade na dosagem da pena.
Na hipótese noticiada nos autos a publicidade institucional, em período vedado, ficou restrita ao quadro de servidores (ativos e inativos) do município, inclusive limitada, aparentemente aos da secretaria de educação e saúde, pois a distribuição dos holerites foi interrompida depois que foi observada com estranheza por alguns funcionários. Não houve gravidade concreta, pois a conduta ilícita ficou inicialmente restrita a apenas alguns dos servidores do quadro de funcionários municipais. Teve sim muita repercussão na comunidade local depois das eleições, quando ajuizada a presente AIJE e o fato foi divulgado pela imprensa, daí causando indignação, porém sem nenhuma influência no pleito, porque já realizado. Não consta que a conduta tenha gerado prejuízos aos cofres públicos.
Nestas circunstâncias, não se aplica a cassação do registro e a inelegibilidade, conforme disposto no art. 73, § 5º, da Lei 9.504/97 c.c. art. 22 da Lei Complementar nº 64/90, considerando que tais sanções se apresentam manifestamente desproporcionais à gravidade da conduta, porque, conforme exposto nesta sentença, não há evidencias de que a conduta vedada teve potencialidade de exercer alguma influência efetiva para desiquilibrar a isonomia das eleições municipais. Além disso, a conduta vedada foi interrompida depois da distribuição de alguns holerites. Portanto, a multa prevista no § 4º, é suficiente para a prevenção e reprovação da conduta, não se justificando que o ato ilícito, que não gerou maiores consequências ou prejuízos, possa provocar uma instabilidade política e administrativa do município, afrontando ainda a soberania do resultado das eleições.
Diante do exposto julgo procedente em parte a presente AIJE e, com base no art. 73, §§ 4º e 8º, da Lei 9.504/97 e aplico aos investigados João Ernesto Johnny Lehmann – Joni e José Danilson Alves de Oliveira, que se beneficiaram da conduta vedada, a multa no valor de vinte e cinco mil UFIR’s, para cada um, fazendo-o neste montante para que não seja vil frente as condições financeiras dos investigados e que represente, efetivamente, valor econômico capaz de impor a necessária e devida reprovação desta modalidade delituosa e também de coibir novas práticas ilícitas.
A multa deverá ser recolhida no prazo de 30 dias, a contar do transito em julgado, ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), conforme estabelece a Resolução-TSE nº 21.975/2004, sob pena de inscrição em dívida ativa (cf. art. 254 do Provimento nº 05/2009-CRE/PR)
Registre-se e intime-se.
Rolândia, 28 de novembro de 2012.
ALBERTO JOSÉ LUDOVICO
Juiz de Direito